quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Crônica da Separação

"Às vezes a vida é o que não parecia dever ser. E nos acomodamos de tal forma que não percebemos que ela passa e leva embora nossos sonhos, nossas alegrias. Nisso formam-se chagas incuráveis que hão de sangrar eternamente mesmo que a dor do punhal perfurando as entranhas passe. E o sangue, mais rubro que o próprio sol, corrói a pele pelos poros até que a própria pele se torne sangue, um sangue incolor e salgado que deságua em forma de amor até o coração. Às vezes a vida leva o que nos era de melhor para um mundo oblíquo, e o rastro desse arrastar de ponteiros e passos fica cravado a ferro na nossa mente, para jamais ser esquecido, apesar de nunca ser lembrado.

E o nosso melhor deixa o vazio em seu lugar, e este toma forma e corpo, aumenta de densidade e vai se apoderando do todo; e quando chega nas lembranças mais ternas e pueris se desfaz, em risos entre prantos, em sorrisos entre lágrimas, em amor em meio a dor. Às vezes a ausência é o único caminho para a presença; que é quando se sente quando não se há, quando se abre ao se fechar, quando a desfeita é uma feita transversa. E nesse ponto a única solução é a solidão, para evitar que se fique solitário; então há a evocação... e a partir daí apenas o adeus é benvindo e celebrado, apesar da dor aparente, sua razão é pelo amor, mais puro do que nunca, quando supera a si próprio abraçando o altruísmo egoísta, que é quando o seu melhor para a ser o melhor do outro."


Maria Ligia Ueno

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